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terça-feira, 29 de maio de 2012

A Inclusão digital e o hiato entre a sociedade e a escola

Nunca estive pensando tanto sobre as distancias que existem entre as coisas que acontecem na escola (o de dentro) e as que acontecem fora dela, quanto nesses últimos meses... Deve ser o efeito “Bonilla” que vai fazendo com que nossa mente vire uma teia de reflexões e relações sobre temas afins ou nem tanto assim. Nessas discussões sobre cibercultura, cibercidadania, gerações de A a Z, mobilidade e inclusão digital, por exemplo, relembro as escolas que temos, as políticas públicas que estão postas, os discursos positivistas e muitas vezes ocos de ações efetivas; e é impossível não perceber o hiato que existe entre a vida aqui fora (a sociedade) e aquela que acontece sob “a proteção” dos muros da escola. Parece que escola e sociedade andam em ritmos diferentes, em mundos diferentes, em sintonias diferentes e que ocasionalmente se encontram em raros e “acidentais” eclipses. Como associar uma sociedade conectada cada vez mais móbil, convergente e “incluída” a uma escola com computadores, mas sem internet, sem rede wi fi, onde a tecnologia que impera na maioria das vezes é o piloto e quadro branco? Um dos grandes paradoxos enfrentados atualmente a partir desse contexto, onde a evolução da internet e outras mídias cresce de modo expressivo essencialmente nas grandes metrópoles, seria o que SILVA (2009) chama de “participação cidadã na era digital” pois, percebemos que apesar das tecnologias estarem mundialmente difundidas, não está ao alcance de todos, sobretudo em nosso país e de modo muito específico nas nossas escolas públicas. De acordo com dados da última pesquisa da Fundação Getúlio Vargas, referente ao ano 2010, a Bahia ocupa o 20º lugar no ranking da Inclusão Digital no Brasil, com cerca 25,62% de residências com microcomputadores, sendo que destes somente 21,6% tem internet, evidenciando o exposto acima. A concepção de inclusão digital que permeia as políticas públicas no Brasil e com a qual temos tido contato desde que tal expressão surgiu (no ano 2000), e mesmo desde a criação do Proinfo e posteriormente com a ampliação para o Proinfo Integrado é limitada e pauta-se visivelmente no provimento de equipamentos “off line” para as escolas e na instrumentalização dos professores para o uso dessas “ferramentas”1 . Não se percebe uma preocupação com a formação política dos sujeitos, com a criação de uma cultura digital que não apenas consuma ou reproduza, mas que seja estimulada a produzir, intervir, alterar, criar e socializar conhecimentos e atitudes, contribuindo para uma sociedade mais interativa, colaborativa, política e consciente. Uma escola off line, com professores “mono” numa sociedade cada vez mais online, com seres (nativos ou imigrantes) potencial e metamorfosicamente multi, aumentará o hiato e “produzirá” cada vez mais alienígenas. E quem são os alienígenas?

1. O termo ferramenta, sobre o qual discordo quando usado para referir-se às tecnologias interativas, foi propositalmente utilizado para melhor explicitar a concepção “dura”, cartesiana e instrumental que as políticas públicas tem dado à inclusão digital.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Inter...ATIVIDADE

O vídeo a seguir retrata a descrição inicial de Levy, quando na abordagem sobre a interatividade  ele fala do Beyond Pages, de Masaki Fjihata o que considera como “uma das mais belas ilustrações das ‘artes da interatividade’”. O vídeo apresenta, num cenário que mistura o real com o virtual,  a imagem de um livro e uma caneta eletrônica e, no pagear do livro, na relação entre signo e coisa, a figura da maçã sendo devorada a cada clique é associada metaforicamente ao “consumo” da informação através da leitura, numa simbiose entre leitor e livro, entre objeto e sujeito, entre coisa e signo. No vídeo, o livro aparece como um transportador de informação e meio de armazenamento da mensagem, servindo também como um símbolo para a cultura textual e para a prática de um método linear de leitura (o passar das páginas, mesmo com recursos eletrônicos como a caneta), apesar de Beyond Pages (além das páginas) apresentar possibilidades de exceder os limites bidimensionais da superfície.
Em Beyond Pages, Fujihata refere-se ao potencial da tecnologia para a formulação de um conteúdo valioso com a fantasia, concentração, a curiosidade, a imaginação, o "jogo" dos corpos... alguns dos principios característicos da interatividade apontados por Levy.


Reflexões sobre objetos de aprendizagem

As discussões sobre objetos de aprendizagem ganharam força com a expansão da internet e, mais especificamente no início deste século com a necessidade de se criar recursos/interfaces/atividades para/com a implementação da EAD no Brasil.  Recursos esses que tomaram forma e são entendidos por muito estudiosos como objetos de aprendizagem, por características abordadas logo a seguir.
Desde então, pelo que se tem estudado não há um consenso para a definição do que venha a ser exatamente um objeto de aprendizagem. Nota-se diferenças de conceitos e de nomenclatura que variam de acordo com os grupos que estudam, o entendimento de pesquisadores do assunto e sobretudo com o enfoque pedagógico que é dado na produção dos objetos.
Os conceitos são carregados de concepções históricas ou ideológicas. Cito como conceito histórico o cunhado por Wiley (2000) e muito comumente utilizado, para quem objeto de aprendizagem é “Qualquer recurso digital que possa ser reutilizado e ajude na aprendizagem”. Desse conceito destaco três aspectos que considero importantes para o entendimento do que sejam, nesta lógica, objetos de aprendizagem: o primeiro é que precisam ser “digitais”, logo qualquer artefato ou recurso criado utilizando tecnologia analógica pode ser entendido como recurso pedagógico, material didático-pedagógico ou qualquer outro nome, mas que definitivamente não se enquadraria na concepção de O.A. ou O.D.A. (Objetos Digitais de Aprendizagem) como também e, a meu ver mais adequadamente, já foram chamados. O segundo aspecto envolve a prerrogativa do reuso, o que indica que na sua construção, os objetos apresentem características, apontadas por TAROUCO et al, 2003) como: generalidade, granularidade, adaptabilidade escalabilidade, flexibilidade... que favorecem a remixagem e a reutilização do todo ou partes, sem perder suas características essenciais, seu sentido e sua função. Por fim, o terceiro aspecto é a aplicação pedagógica ou sua utilização com fins pedagógicos o que pode, atribuir sentidos ao seu uso, tornando-os não necessariamente mais atrativos, mas bastante funcionais.
Há algumas definições mais amplas que consideram  não apenas o digital como objetos de aprendizagem. Uma das mais conhecidas é a do Learning Objects Metadata Workgroup, um grupo especializado em estudos e catalogação de metadados para objetos de aprendizagem; para quem "qualquer entidade, digital ou não digital, que possa ser utilizada, reutilizada ou referenciada durante o aprendizado suportado por tecnologias", pode ser entendido como O.A.

A despeito das diferenças conceituais e das discussões se somente digitais ou não, são entendidos como objetos de aprendizagem, há duas características sobre as quais parece haver consenso entre todos os pesquisadores: a característica do reuso (flexibilização e possibilidades de reutilizar em diversos contextos ou situações) e a aplicação na educação, como suporte à aprendizagem. Sobre esta ultima característica, levanto uma questão que ainda não me parece muito clara, conceitualmente falando, mas que será apenas mais um elemento de sequencia de pesquisas:  Um objeto de aprendizagem essencialmente nasce com fins educacionais ou ele pode, mesmo criado sem esta finalidade, constituir-se em tal?  
Há, naturalmente muito a se considerar sobre o assunto; desde o processo de concepção, criação, passando pela validação, armazenamento (repositórios), compartilhamento, uso e avaliação. Vou pausar essas considerações refletindo um pouco e bem superficialmente sobre a estrutura de boa parte dos objetos de aprendizagem que encontramos nos nossos repositórios. Embora muitos já apresentem propostas mais interativas, inovadoras, fluidas e inteligentes, muitos deles foram e são construídos numa lógica totalmente linear e é comum perceber ranços do behaviorismo de Skinner com foco no associacionismo, na lógica do condicionamento operante e na instrução programada, com respostas pré-programadas e esperadas na solução de enigmas ou problemas propostos. Muitos dos objetos seguem a lógica cartesiana, muitos limitam as ações e reflexões e primam pela repetição mecânica dando pouca ou nenhuma possibilidade de ação e interação.
A elaboração dos objetos de aprendizagem, assim como toda a ação pedagógica é embasada por teorias epistemológicas que permeiam toda a nossa formação/ação e permanecem arraigadas, justificando e alicerçando a visão de mundo e de educação de quem produz, valida, usa e reusa os objetos de aprendizagem. É, conforme Paulo Freire, a perspectiva da não-neutralidade inerente ao ato de educar – um ato político, por assim dizer.
RECOMENDO, A TÍTULO DE COMPLEMENTAÇÃO...

A entrevista com César Nunes, educador que desenvolveu o projeto Objetos de Aprendizagem na Escola do Futuro da USP. Clique no link:


Referências (bases de leituras):
FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia - Saberes necessários à prática educativa. São Paulo, Brasil: Paz e Terra, 1997.

TAROUCO, Liane M. R. et al. Alfabetização visual para a produção de objetos educacionais. Disponível em: < http://www.cinted.ufrgs.br/renote/set2003/artigos/artigo_anita.pdf>. Acesso em:
15 fev. 2006.